Homem traído retorna à cidade natal e surpreende-se diante do túmulo da mãe

João parou o carro. Quantas vezes ele planejara visitar, mas nunca encontrava tempo. Enquanto a mãe estava viva, ele não estava por perto. Depois que ela partiu, também não.

As memórias disso enchiam-no de nojo por si mesmo. Tão pouco teria bastado – simplesmente sacudi-lo para que percebesse que o mundo que criara ao seu redor era apenas ilusão. Nenhuma palavra, nenhum gesto tinha verdadeiro significado. Até sentia um estranho agradecimento a Sofia, sua ex-mulher, por lhe ter aberto os olhos.

De repente, tudo desabou. Sua vida familiar exemplar, suas amizades – tudo falso. Descobriu que a esposa e o melhor amigo o traíam, enquanto os outros, sabendo da verdade, calavam-se. Foi a ruína total. Todos ao seu redor o haviam traído. Após o divórcio, João voltou à sua cidade natal. Oito anos desde o funeral da mãe, e ele nunca encontrara tempo para visitar seu túmulo. Só agora percebera que ela fora a única pessoa que jamais o trairia.

João casara-se tarde. Tinha 33 anos, e a noiva, 25. Ah, como se orgulhava ao vê-la ao seu lado! Sofia parecia elegante, sofisticada. Mais tarde, quando ela gritara em seu rosto que odiara cada momento da vida juntos, que a intimidade com ele era um martírio, João percebeu quão cego estivera. Seu rosto, distorcido pela raiva, parecia uma máscara horrível. E ele quase caíra no choro. Sofia chorara tão convincentemente, jurando arrependimento, dizendo que ele sempre estava ocupado, que ela se sentia sozinha.

Mas quando ele afirmou, firme, o divórcio, ela mostrou o verdadeiro carácter. João saiu do carro, pegou um enorme ramo de flores. Caminhou lentamente pelo cemitério. Tudo certamente estava abandonado. Nem sequer viera quando colocaram a lápide. Tudo fora resolvido online, à distância. Assim a vida passa.

Para sua surpresa, o túmulo estava impecável, sem uma erva daninha. Alguém cuidava dele. Quem? Talvez uma antiga amiga da mãe. Afinal, ele nunca viera. Abriu o portão. “Olá, mãe”, sussurrou. A garganta apertou, os olhos arderam. Lágrimas escorreram.

Ele, um empresário bem-sucedido, um homem que nunca chorava, agora soluçava como uma criança. E não queria parar. As lágrimas, de alguma forma, lavavam sua alma, levando consigo tudo o que lembrava Sofia e outras desilusões. Era como se a mãe afagasse sua cabeça e murmurasse: “Acalma-te, vai ficar tudo bem”. Ficou muito tempo sentado, conversando mentalmente com ela. Lembrou-se de quando ralava os joelhos e chorava. A mãe passava betadine, assoprava e dizia: “Não é nada, todos os meninos caem. Vai sarar”. E sarava. A cada vez, a dor doía menos.

“A tudo nos habituamos, menos à traição”, dizia ela. Agora ele entendia. Na época, pareciam só palavras, mas hoje via quanta sabedoria havia nelas. Ela o criara sozinha, sem bajulações, mas sem faltar amor.

Não sabia quanto tempo passara, e não queria olhar o relógio. Sentia-se em paz. Decidiu ficar na cidade alguns dias. Precisava resolver algo sobre a casa da mãe. Claro, podia pagar à vizinha para cuidar, mas até quando ficaria vazia? Sorriu, lembrando-se da filha dela. Quando combinara os cuidados, conhecera Ana. Estava tão amargurado, tão perdido. Ana fora gentil. Encontraram-se à noite, conversaram, e tudo aconteceu naturalmente. De manhã, ele partira, deixando uma nota sobre onde guardar a chave.

Aos olhos de Ana, talvez parecesse mal. Mas ele não prometera nada. Foi consentido. Ela viera à mãe depois de se divorciar de um marido tirano. Contou-lhe tudo. Estava difícil para ambos. E assim aconteceu. Só isso.

— Senhor, pode ajudar-me? — uma voz infantil interrompeu-o. Virou-se e viu uma menina de sete ou oito anos com um balde vazio.

— Preciso de água para regar as flores. Eu e a mamã plantámos, mas hoje ela está doente. Se não regar, morrem. A água é ali perto, mas o balde é pesado. Não quero que ela saiba que vim sozinha. Senão, vou ter de fazer muitas viagens e ela descobre.

João sorriu.

— Claro, mostra-me.

A menina caminhava à frente, tagarelando. Em cinco minutos, ele soube tudo: que ela avisara a mãe para não beber água gelada no calor, que agora ela estava doente. Beatriz viera ao túmulo da avó, que morrera há um ano. A avó ralharia com a mãe, que nem teria adoecido. E que Beatriz estava no primeiro ano e sonhava em terminar o secundário com média máxima.

João sentia-se mais leve. Que pureza nas crianças! Percebia agora que seria feliz com uma esposa comum, um filho esperando-o em casa. Sofia era como uma boneca cara, e filhos? Nem pensar. Chamara de tolas as mulheres que “estragavam o corpo” por um bebé. Foram cinco anos de casamento. E agora, João não tinha uma única memória feliz.

Colocou o balde junto ao túmulo, e Beatriz regou as flores com cuidado. Ele olhou para a lápide e congelou. A foto era da vizinha que cuidava da casa. A mãe de Ana. Olhou para a menina.

— A Maria Fernanda era sua avó?

— Sim. O senhor conhecia-a?

— Desculpe, é que estava no túmulo dela. Eu e a mamã limpamos sempre e trazemos flores.

— Você e a sua mãe? — perguntou ele, confuso.

— Sim, com a minha mãe. Já disse, ela não deixa eu vir sozinha.

Beatriz pegou o balde e olhou em volta.

— Tenho de ir, senão ela preocupa-se e pergunta tudo, e eu não sei mentir.

— Espera, posso levar-te.

Ela abanou a cabeça.

— Não posso ir no carro com estranhos. E não quero que a mamã fique triste, ela já está doente.

Beatriz despediu-se e saiu correndo. João voltou ao túmulo da mãe. Sentou-se, pensativo. “Estranho. Ana não morava aqui, viera só temporariamente. Agora percebo que ela vive aqui e tem uma filha.”

Na época, ele não sabia que Ana tinha uma criança. Mas quantos anos teria Beatriz? Talvez Ana se casara depois. Após mais algum tempo, levantou-se. Provavelmente, Ana cuidava da casa, e era a ela que ele pagava.

Bem, no fundo, que importava a quem pagava? João chegou à casa. O coração apertou. Nada mudara. Parecia que a mãe sairia a qualquer momento, enxugando lágrimas com o avental para abraçá-lo. Demorou a sair do carro. A mãe não apareceu. Entrou no jardim. Surpreendeu-se. Até as flores estavam plantadas.

Tudo bonito, cuidado. Boa, Ana. Precisava agradecê-la. Dentro de casa, tudo brilhava, limpo e fresco. Como se alguém morasse ali e tivesse saído por pouco. Sentou-se à mesa, mas logo levantou. Precisava falar com a vizinha. Resolver tudo, depois descansar. A porta abriu-se. Era Beatriz.

— Olá, é o senhor! — Colocou um dedo nos lábios e piscou. — Não diga nada à mamã, está bem? Sobre o cemitério.

Ele fingiu trancar a boca com uma chave, e ela riu.

— Entrem — chamou AnaEle entrou, viu Ana sorrindo com os olhos úmidos, e soube que finalmente encontrara o lugar onde pertencia.

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