Dizem que o dia do casamento é o mais feliz da vida. Nunca contam que também pode ser o dia em que o teu mundo se desfaz em cinzas enquanto ficas ali, de vestido branco, a ver tudo em que acreditaste ruir. Chamo-me Inês, e esta é a história de como descobri que as duas pessoas em que mais confiava me mentiam há meses. Mas mais do que isso, é a história do que fiz a seguir — algo tão inesperado, tão devastador, que deixou uma sala cheia de gente de joelhos. Alguns chamam-lhe vingança. Eu chamo-lhe justiça.
Há três meses, pensava ter a vida controlada. Era professora primária, de 26 anos, noiva de Ricardo, um gestor de construção bonito, de olhos verdes que se apertavam quando sorria. Éramos o casal dourado da nossa pacata vila de Vilar Formoso. A minha madrinha era Catarina, a minha melhor amiga desde os sete anos, uma mulher tão deslumbrante que fazia virar cabeças. Era a minha pessoa, aquela em que confiava cegamente. Mergulhou no planeamento do casamento com um entusiasmo contagiante, ajudando-me a escolher o local, a provar bolos e a endereçar convites com a sua letra impecável. “Mereces esta felicidade”, dizia-me, apertando-me a mão. “O Ricardo tem muita sorte em te ter.” Acreditei nela. Confiei nos dois.
Na véspera do casamento, a minha tia-avó Rosa, tão perspicaz quanto bondosa, pegou nas minhas mãos com as suas mãos enrugadas. “O casamento não é sobre o dia, querida”, disse-me. “É sobre escolher-se um ao outro quando as coisas ficam difíceis. Certifica-te de que te casas com alguém que também te escolherá a ti.” Acenei, certa de que sim. Eu e o Ricardo éramos sólidos. Estávamos prontos. Adormeci naquela noite a sonhar com o meu caminho até ao altar.
O dia 15 de junho amanheceu radioso. A manhã foi um turbilhão de penteados, maquilhagem e risos nervosos. No local, a Quinta da Ribeira, tudo parecia saído de um conto de fadas. Rosas brancas e flores delicadas enfeitavam cada canto. Era perfeito. Às 13:30, a Catarina saiu do quarto da noiva para verificar as flores. “Já volto”, prometeu. “Não estragues o batom.”
Às 13:45, a organizadora do casamento ligou. “Pequeno imprevisto”, disse, a voz contida. “O noivo está um pouco atrasado.” Um frio percorreu-me o estômago. O Ricardo nunca se atrasava. Às 14:00, o frio transformara-se num nó. A organizadora ligou outra vez. “Não conseguimos contactá-lo.” Tentei ligar ao Ricardo. Chamada direta para o correio de voz. Tentei a Catarina. O mesmo.
Às 14:15, os meus pais estavam à porta, os rostos tensos. “Filha”, disse o meu pai com cautela, “vamos resolver isto.” Mas eu já estava a mover-me. “O hotel”, disse subitamente. “Ele ficou no Hotel Vilar na noite passada.”
“Inês, talvez devêssemos esperar”, suplicou a minha mãe.
“Não”, respondi, a palavra cortante. “Preciso de saber onde está o meu noivo.” A tia Rosa apareceu ao meu lado. “Vou contigo”, afirmou, firme. “Não deves enfrentar isto sozinha.”
O Hotel Vilar era uma pousada histórica e acolhedora. A rececionista idosa olhou para mim com uma mistura de confusão e pena enquanto me entregava a chave do quarto nupcial. O corredor no primeiro andar estava em silêncio, mas ao aproximar-me do quarto 37, ouvi sons abafados vindos de dentro. O meu coração batia tão forte que julguei que todos o ouviam. Introduzi a chave na fechadura e abri a porta.
O quarto estava escuro, as cortinas pesadas fechadas. Demorei um instante a ajustar os olhos, a compreender a cena à minha frente. A cama estava desfeita, os lençóis emaranhados. O fato do Ricardo, aquele em que devia casar-se, estava amachucado no chão, ao lado de um vestido lilás — o vestido da Catarina. E ali, na cama, estavam o Ricardo e a Catarina, despidos, entrelaçados, a dormir.
O ar fugiu-me dos pulmões. A sala girou. Atrás de mim, ouvi a minha mãe suspirar e o meu pai praguejar. Não conseguia mexer-me. Fiquei ali, a olhar para a garrafa de champanhe vazia no criado-mudo, para as joias da Catarina espalhadas pela cómoda, para os destroços da minha vida.
O Ricardo mexeu-se, os olhos a abrirem-se devagar. Quando me viu ali, de vestido de noiva, o rosto dele empalideceu. “Inês”, murmurou, sentando-se de repente e acordando a Catarina. “Inês, posso explicar.”
“Explicar?” A palavra foi um sussurro, mas cortou o ar como uma faca. “Explicar porque estás na cama com a minha melhor amiga no dia do nosso casamento? Explicar porque é que duzentas pessoas estão à espera de um noivo que está demasiado ocupado com a minha madrinha para aparecer?”
A Catarina estava acordada agora, os olhos arregalados de horror. “Inês, por favor”, gaguejou, segurando o lençol contra o peito. “Não é o que parece.”
“Não é o que parece?” Ri-me, um som agudo e quebrado. “Parece que o meu noivo e a minha melhor amiga me traíram. Então, por favor, Catarina, diz-me o que realmente é.”
Não tinham resposta. Voltei-me para a minha família — a minha mãe a chorar, o meu pai com um olhar assassino e a tia Rosa, a observar-me, à espera de ver o que faria a seguir.
“Chamem-nos”, disse calmamente. “Chamem os pais dele, a irmã, o padrinho. Digam-lhes para virem cá acima. Precisam de ver isto.”
“Inês, por favor”, suplicou o Ricardo, o pânico nos olhos. “Vamos falar disto em privado.”
“Em privado?” Virei-me para ele, algo frio e duro a surgir no meu peito. “Queres falar em privado depois de me humilhares em frente a toda a vila?”
Comecei a fazer as chamadas eu mesma. Em vinte minutos, o quarto nupcial estava cheio — os pais dele, a irmã Teresa, o padrinho — os seus rostos um misto de choque, horror e nojo.
“Foi um erro”, disse o Ricardo, desesperado. “Um erro estúpido, bêbado. A Catarina não significa nada para mim.”
“Não significa nada?” Repeti, a voz a subir. “Dormiste com a minha madrinha no dia do nosso casamento, e não significa nada?”
Aproximei-me da cómoda onde estava a mala aberta da Catarina. Dentro, vi um cartão de hotel — não deste quarto. “Catarina”, disse, erguendo-o. “O que é isto? O Hotel Douro, do mês passado, quando disseste que ias visitar a tua amiga da faculdade?” Puxei outro. “O Hotel Grande, de há três semanas, quando tiveste a ‘conferência de trabalho’?”
O silêncio na sala foi ensurdecedor. Isto não fora um erro pontual. Durara meses.
“Quero que todos voltem à quinta”, disse calmamente. “Digam aos convidados o que aconteceu. Digam que não haverá casamento porque o noivo estava demasiado ocupado a dormir com a madrinha.”
“Inês”, suplicou a mãe dele, a voz a quebrar. “Pensa na tua reputação.”
“Minha reputação?” Sorri, desta vez com leveza. “Com todo o respeito, não sou eu quem devia preocupar-se com isso agora.”