Sentei-me num canto da sala de espera do hospital, com a minha mala desgastada no colo. O casaco era demasiado fino para o frio que fazia, e os sapatos, gastos e desiguais. A sala estava cheia, mas todos mantinham distância — alguns por julgamento, outros por desconforto.
Uma senhora inclinou-se para o marido e sussurrou: “Deve estar perdida. Provavelmente entrou da rua sem querer.” Ele riu-se.
“Está só à espera do café gratuito, não é doente.” Um grupo de familiares bem-vestidos olhou para ela, revirou os olhos e riu baixinho sempre que ela mexia na mala ou mudava de posição. Uma enfermeira até lhe perguntou, com delicadeza: “Minha senhora, tem certeza de que está no sítio certo?”
“Sim, querida,” respondeu ela suavemente. “Estou exatamente onde devo estar.”
Passou uma hora. Depois duas. E ela continuou à espera. Por fim, as portas duplas abriram-se e um homem de bata cirúrgica entrou, olhando em volta. Parecia exausto — a máscara caída, o cabelo despenteado — e dirigiu-se diretamente à velhinha. Todos olharam.
Parou à sua frente, com os olhos mais suaves, e disse, alto o suficiente para que toda a sala ouvisse: “Já quer contar-lhes quem é?”
O silêncio tomou conta do lugar. A mulher ergueu lentamente a cabeça, piscando os olhos para ele. Os lábios tremiam-lhe um pouco, mas o olhar era firme.
“Acho que já é hora,” murmurou. O cirurgião inclinou-se, pegando-lhe na mão com uma ternura surpreendente. Ela levantou-se, as costas curvadas, mas os passos seguros. Todos os que a tinham gozado fitavam-na agora, em silêncio estupefato.
A enfermeira que a questionara antes desviou o olhar, envergonhada. O cirurgião virou-se para a multidão e aclarou a garganta.
“Esta senhora,” disse ele, “é a razão pela qual estou aqui hoje.” Murmúrios e suspiros espalharam-se pela sala.
“Chamo-me Dr. Tiago Monteiro. Acabo de realizar uma cirurgia de catorze horas. Um triplo bypass que salvou a vida de um homem. E a razão pela qual consegui fazê-lo — a razão pela qual me tornei cirurgião — é por causa dela.” Acenou para a mulher, que agora permanecia de pé, com um orgulho sereno nos olhos.
“O nome dela é Amélia. Não é apenas uma velhinha qualquer. É a mulher que me criou quando mais ninguém quis.”
“Ela teve dois empregos a limpar para pagar os meus materiais escolares. Passou fome para eu poder comer. Quando lhe disse que queria ser médico, ela respondeu: ‘Então sê o melhor que puderes.'” Os olhos de Amélia brilhavam, mas não chorou.
“Eu nunca conheci os meus pais biológicos,” continuou o Dr. Monteiro. “Fui deixado num orfanato aos três anos. A Amélia era voluntária lá. Olhou para mim e disse: ‘Acho que este é meu agora.'”
A sala estava em absoluto silêncio. “Ela adotou-me sem dinheiro, sem ajuda. Apenas com amor. Hoje esperou cinco horas porque eu pedi para a ver depois da cirurgia. Não por uma emergência. Só para a abraçar. Porque prometi que sempre faria tempo para a mulher que nunca desistiu de mim.” Virou-se e envolveu-a num longo abraço.
Os ombros dele tremiam. Alguém na sala começou a aplaudir. Depois outra pessoa. Em instantes, todos estavam de pé, a bater palmas.
Amélia olhou em volta, confusa. “Porque é que estão a aplaudir?” perguntou baixinho.
“Porque o mereces, mãe,” ele sorriu.
Quando o momento passou e a sala se acalmou, Amélia sentou-se novamente ao seu lado. A enfermeira que antes duvidara dela trouxe-lhe uma chávena de chá quente, as mãos a tremer ligeiramente.
“Peço imensa desculpa, minha senhora,” disse. Amélia sorriu. “Não faz mal, querida. Por vezes, só vemos o superficial. Também já o fiz.”
Uma das mulheres que a tinha gozado aproximou-se, envergonhada, com a mala de marca apertada contra o peito. “Eu não sabia…” balbuciou.
“Não tem importância,” Amélia respondeu. “Todos julgamos.”
Mas o cirurgiãoMas quando o silêncio voltou, Amélia fechou os olhos e sorriu, sentindo-se finalmente vista.