O sol começava a banhar as ruas da cidade com um brilho dourado quando Rodrigo Monteiro saiu do seu SUV preto. Como CEO da Monteiro Inovações, estava habituado ao burburinho das salas de reuniões luxuosas, hotéis de elite e aeroportos privados—mas hoje era diferente. Hoje, algo o trouxera de volta ao canto mais tranquilo da cidade onde crescera.
Ajustou as mangas do seu casaco bem cortado e dirigiu-se à padaria do bairro. Era a única coisa da sua infância que não mudara. Um aroma de canela envolvia o ar, despertando memórias que não tocava há anos—especialmente dela.
**Mafalda.**
O coração parou quando o nome ecoou no peito. Não a via desde os dezasseis anos. Fora sua melhor amiga, seu amor secreto, a rapariga que colara um bilhete de incentivo no seu cacifo antes de uma competição importante de ciências. Lembrava-se do riso suave dela, dos ganchos de girassol no cabelo e da forma como acreditara nele antes de qualquer outra pessoa.
Enquanto caminhava, o telemóvel vibrou com uma notificação, mas algo o fez parar.
Uma voz pequena.
“Mamã, tenho frio…”
Rodrigo virou-se e viu uma jovem sentada no passeio, os braços envoltos em torno de duas gémeas idênticas. As meninas não deviam ter mais de três anos, as bochechas coradas de frio, os casacos demasiado finos para o inverno.
Poderia ter continuado a andar—até ver o rosto da mulher.
A respiração falhou-lhe.
“Mafalda?”
Ela ergueu os olhos, surpreendida. O espanto estampou-se no seu rosto.
“Rodrigo…?” sussurrou.
Por um momento, o tempo dobrou-se. Viu flashes do passado—o seu sorriso, os passeios junto ao rio, a sua voz a ler em voz alta nos estudos.
Ajoelhou-se ao seu lado. “O que aconteceu, Mafalda? Onde estiveste?”
Lágrimas encheram-lhe os olhos enquanto puxava as meninas para perto. “Nunca imaginei voltar a ver-te. Assim.”
As gémeas olharam para ele, curiosas e cautelosas.
“Perdi tudo, Rodrigo,” disse baixinho. “Casei. O meu marido… faleceu num acidente depois de elas nascerem. Não tinha seguro. Nem poupanças. Fomos despejados dois meses depois. Não tinha família. Desde então, tenho tentado sobreviver.”
Ouviu a vergonha na sua voz—e o cansaço.
“Há quanto tempo estás assim?” perguntou, suave.
“Quase dois anos,” respondeu, os olhos baixos. “Faço biscates quando posso, mas com gémeas… é difícil. Algumas noites, ficamos num abrigo. Outras…”
Não terminou, mas ele viu-a tremer.
Olhou para as gémeas. Uma puxou-lhe a manga. “És médico?”
Sorriu. “Não, querida. Sou um amigo antigo da tua mãe.”
A menina assentiu, séria. “Pareces rico. Como nas novelas.”
“Mafalda,” disse Rodrigo, firme, “Vem comigo. Por favor. Tu e as meninas. Agora. Não posso deixar-vos aqui.”
Os olhos dela alargaram-se em pânico. “Não posso—Rodrigo, não sou tua responsabilidade.”
“Não és,” ergueu-se. “Não és minha responsabilidade. És alguém que me importo. Alguém de quem nunca deixei de pensar.”
Estendeu a mão.
Mafalda olhou para as gémeas, depois para ele.
E, pela primeira vez em muito tempo, estendeu a mão e aceitou-a.
Em menos de uma hora, estavam todos envoltos em roupas quentes, na ala dos hóspedes do apartamento de Rodrigo, com vista para a cidade. Uma chávena de chocolate quente repousava na mesa enquanto as gémeas exploravam o espaço, maravilhadas com a televisão e os tapetes fofos.
Mafalda sentou-se na ponta do sofá, tensa, como se tudo pudesse desaparecer.
“Parece um sonho,” murmurou.
Rodrigo sentou-se à sua frente, o olhar terno. “Não é. E lamento ter demorado tanto a encontrar-te.”
Ela fitou-o. “Porque estás a fazer isto, Rodrigo?”
Ele hesitou.
“Porque, quando eu não era ninguém, fizeste-me sentir que era alguém. Acreditaste em mim, deste-me confiança. Aquele projeto de ciências? Só o fiz por tua causa.”
Mafalda sorriu, triste. “Sempre soube que farias coisas grandes.”
“E agora,” continuou, “quero fazer algo bom—com tudo o que tenho.”
Ela conteve as lágrimas. “Tenho medo. Não quero ser caridade.”
“Não és,” disse ele, firme. “És a Mafalda. A mesma rapariga forte e bondosa que conheci. Passaste por uma tempestade. E quero ajudar-te.”
Nas semanas seguintes, instalaram-se numa casa nos arredores, propriedade de Rodrigo.
Ele contratou uma professora para as gémeas, matriculando-as numa escolinha. Apresentou Mafalda a uma amiga que tinha um ateliê de design, lembrando-se dos esboços de vestidos que ela fazia na escola.
Para sua surpresa, Mafalda revelou-se talentosa, com ideias vibrantes e elegantes.
“Não acredito,” sussurrou, mostrando-lhe um portfólio. “Sempre sonhei com isto.”
“Então vamos tornar real,” disse Rodrigo. “Cria a tua marca.”
Ela hesitou. “Não sei gerir um negócio.”
“Por sorte,” sorriu ele, “eu sei.”
Com a ajuda dele—mas com o seu próprio mérito—Mafalda lançou a **Girassol & Linha**, uma marca de moda inspirada nos seus esboços e na maternidade. Cada peça era feita à mão, muitas costuradas por mulheres de abrigos onde ela estivera.
A sua história tornou-se conhecida—uma mãe que superou a adversidade, ajudando outras mulheres.
Mas o que ninguém sabia era que, por trás, estava um homem que nunca quis reconhecimento—que apenas a via brilhar.
As gémeas, agora no infantário, chamavam-lhe “Tio Rodrigo”. Ele levava-as à escola, ajudava nos trabalhos de casa e ensinava-as a fazer bolinhos aos domingos.
Mafalda, observando da cozinha, sentiu lágrimas nos olhos.
“Estás bem?” perguntou ele.
Ela sorriu. “Melhor que bem.”
Num jantar no terraço, um ano depois do reencontro, Rodrigo confessou:
“Mafalda… nunca deixei de te amar. Nem quando desapareceste. Nem quando voltaste. Quero estar contigo—pelas meninas, e por ti. Se me deixares.”
Ela ficou em silêncio, tocada pela sinceridade.
“Não sou a mesma, Rodrigo. Sou mãe. Passei por demasiado.”
“E eu não sou o mesmo rapaz,” disse ele. “Mas o que não mudou… é o que sinto quando te vejo.”
Lágrimas rolaram-lhe pela face.
“Tive tanto medo de perder tudo,” sussurrou.
“Não perdeste,” ele segurou-lhe a mão. “Ainda não tinhas encontrado o caminho de volta.”
Dois anos depois, a **Girassol & Linha** abriu uma segunda loja. Mafalda empregava mais de 20 mulheres, dando-lhes dignidade.
As gémeas—**Bia e Lara**—floresciam. Pintavam, brincavam no jardim e tentavam imitar a lasanha do “Tio Rodrigo”.
E num verão, sob uma chuva de pétalas de girassol, Mafalda e Rodrigo casaram-se, com as meninas a passear e a segurar as mãos da mãe.
Tudo se fechE anos depois, quando alguém perguntava às meninas como era a vida antes de encontrarem Rodrigo, elas simplesmente sorriam e respondiam: “Não me lembro, porque agora é que a vida começou.”