Maria dobrou cuidadosamente a última camisa e colocou-a na mala do Pedro. Depois de tantos anos de casamento, fazer as malas para as suas viagens de trabalho tinha-se tornado um ritual silencioso que ela apreciava, arrumando cada item com carinho.
“Não te esqueças do carregador do portátil,” lembrou-o enquanto fechava a mala. Pedro olhou para o relógio, visivelmente tenso.
“Obrigado, querida. Tenho de ir. O táxi já chegou.” Deu-lhe um beijo rápido na bochecha, agarrou a mala e correu para a porta.
“Liga quando chegares!” gritou Maria. “Ligo!” respondeu ele, enquanto a porta se fechava.
Ela aproximou-se da janela e viu o carro a afastar-se. A despedida apressada parecia estranha; normalmente, era mais demorada, mais carinhosa. Mesmo assim, ignorou o pensamento—devia estar ansioso com a reunião que se aproximava. O apartamento de repente pareceu vazio e frio. Para se distrair, Maria decidiu ir ao Colombo Shopping e comprar finalmente umas coisas que andava a adiar.
Horas depois, carregada de sacos, caminhava pelo centro comercial. Tinha planeado almoçar no seu café preferido, no terceiro piso, mas o telemóvel tocou: uma colega sugeriu encontrarem-se no restaurante Amêndoa, no segundo andar, para provar o novo menu. Maria aceitou; o restaurante era perto e, apesar de não ir lá muitas vezes, gostava do ambiente.
Ao subir para o segundo piso, já conseguia ver o interior do Amêndoa pelas grandes janelas. De repente, os pés colaram-se ao chão: Pedro estava sentado a uma mesa perto da janela. À sua frente, uma mulher jovem que Maria nunca tinha visto. Conversavam animadamente.
A mulher riu-se, tocando-lhe suavemente na mão, e nos olhos do Pedro, Maria viu uma expressão que não via há muito tempo.
O tempo parou. O coração gelou, e a visão turvou-se. O homem que supostamente estava num voo para Berlim estava a almoçar com outra mulher.
O primeiro impulso foi entrar a exigir explicações. Mas alguma coisa—orgulho, talvez medo—impediu-a. Respirou fundo, virou-se devagar e afastou-se.
Com os dedos a tremer, cancelou o almoço com a colega e ligou à melhor amiga.
“Inês, podes encontrar-te comigo? Agora,” disse, a voz a falhar.
“O que aconteceu?” perguntou Inês, alarmada.
“Acabei de ver o Pedro com uma mulher num restaurante. Ele devia estar num avião.”
“Onde estás?”
“No Colombo.”
“Espera por mim no Café Água-Marinha, no piso térreo. Chego em quinze minutos.”
Maria sentou-se num canto, mexendo distraidamente o chá gelado. As perguntas multiplicavam-se. Quem era aquela mulher? Há quanto tempo isto acontecia? Será que Pedro tinha mesmo feito todas aquelas viagens? As chamadas à meia-noite, as noites fora, a nova palavra-passe no telemóvel…
“Maria!” a voz de Inês interrompeu-a. Sentou-se à frente e apertou-lhe as mãos.
“Conta-me tudo.”
Maria descreveu a cena, controlando a voz.
“Não sei o que fazer, Inês. Parte de mim nem quer saber a verdade.”
“E se não for o que parece? Talvez haja uma explicação.”
Maria sorriu, amarga. “Que explicação pode haver para um homem que mente sobre uma viagem de trabalho e almoça com outra mulher?”
“Não sei,” admitiu Inês. “Mas antes de decidires, talvez devas investigar?”
“Como? Perguntar-lhe diretamente?”
Inês pensou. “E se os seguirmos? Vamos ver para onde vão.”
Espiar o marido era humilhante, mas a incerteza doía ainda mais. Maria anuiu.
Esconderam-se na livraria em frente ao restaurante, fingindo ver livros. Quarenta minutos depois, Pedro e a acompanhante saíram. A mulher era uma morena elegante, de cerca de trinta anos, com um porte impecável.
“Estão a sair,” sussurrou Inês.
Mantendo a distância, seguiram-nos. Lá fora, a mulher entrou num táxi. Pedro ajudou-a, trocaram um aperto de mão rápido, e o carro partiu. Pedro ficou no parque de estacionamento, telefonou a alguém e depois chamou outro táxi.
“Vamos segui-lo,” disse Maria.
O táxi delas seguiu o dele até ao Centro Empresarial Tagus, onde ficava o escritório da empresa dele. Dentro, ele falou com a rececionista antes de desaparecer no gabinete do chefe.
“Talvez a viagem tenha sido cancelada em cima da hora,” sugeriu Inês.
“Então quem é a mulher? E porque não me ligou?”
Esperaram. Meia hora depois, Pedro saiu com uma pasta e desceu. Maria e Inês esconderam-se atrás de uma coluna e correram para outro táxi.
“Casa,” ordenou Maria. Acertou: o táxi de Pedro parou à frente do prédio deles. Maria deixou Inês ir embora e entrou sozinha.
Pedro estava na cozinha, a olhar para o portátil.
“Maria! Já estás em casa?” Parecia genuinamente surpreendido.
“Como vês,” respondeu ela, friamente. “Não devias estar num avião?”
Ele ficou tenso. “A viagem foi cancelada à última hora. Ia ligar, mas tudo ficou caótico.”
“Tão caótico que não conseguiste mandar uma mensagem?”
“Desculpa.” Baixou os olhos. Maria sentou-se à sua frente.
“Quem era ela, Pedro?”
“Quem?” franziu a testa.
“A mulher com quem almoçaste no Amêndoa.”
Ele empalideceu. “Estiveste a seguir-me?”
“Não. Vi-te por acaso.”
O silêncio prolongou-se. Finalmente, ele falou: “Não é o que estás a pensar.”
“O que é que eu devo pensar? Disseste que ias viajar e estavas a almoçar com outra mulher!”
“Chama-se Ana Sofia. Representa investidores alemães.”
“E por isso mentiste sobre a viagem?”
“Não menti. A viagem foi cancelada quando já estava no aeroporto. O meu chefe ligou: uma investidora estava de passagem pela cidade. Tive de me encontrar com ela.”
“Porque não me disseste?”
Hesitou. “Porque… não foi uma reunião normal.”
O coração de Maria apertou. “Eu sabia.”
“Não, não é isso! O meu chefe disse-me: se a convencesse a assinar o contrato com condições especiais, eu seria promovido a diretor comercial.”
“E nem sequer podias mandar uma mensagem?”
“Queria surpreender-te se desse certo. Se não desse, para quê preocupar-te?”
“Deu certo?” perguntou Maria.
Pedro sorriu. “Sim. Assinou um acordo preliminar. A delegação principal vem no próximo mês.”
Ela ainda duvidava. Abriu a pasta: lá estava o contrato, assinado por Ana Sofia Müller. Depois, tirou uma caixa de veludo; dentro, um colar de safiras que Maria tinha admirado.
“Comprei isto na semana passada e ia dar-to hoje, com a notícia.”
A raiva dissipou-se, mas uma dúvida permaneceu: “Porque é que parecias tão feliz com ela?”
“Ela aceitou as nossas condições; foi um alívio, nada mais.”
Apertou-lhe a mão. “Tu és a única mulher na minha vida. As minhas viagens são reais.”
Maria quis acreditar. “Posso fazer-te umas perguntas?”
“Claro.”
“O que é que comeram?”
“Ela pediu a salada da casa e o bife com molho de trufa. Eu pedi o”Eu pedi o peixe,” ele respondeu, e Maria sorriu, decidindo confiar novamente no amor que os unia.