Ele Levou Flores para o Túmulo da Esposa—Mas o Que Encontrou Lá o Deixou Chocado

O vento de fevereiro uivava sobre o antigo cemitério nos arredores de Alcácer do Sal, empurrando folhas secas entre cruzes inclinadas e lápides modestas.
Diogo Mendes caminhava com passos firmes, envolto num casaco preto e grosso, as mãos enfiadas nos bolsos. O rosto permanecia calmo, quase distante, embora, por dentro, os pensamentos fervilhassem.

Como fazia todos os anos, ali estava para cumprir o seu ritual silencioso — visitar o túmulo da esposa, Leonor. Cinco anos já se passaram desde que ela partira, e, embora a dor exterior tivesse desaparecido, Diogo continuava destroçado por dentro.
Aquele dia levara não apenas o amor da sua vida, mas também o calor da sua casa no bairro histórico, a alegria das noites partilhadas com café e a ligação invisível que o mantinha à tona.

Parou diante de uma singela lápide de granito cinzento. O nome de Leonor estava gravado em letras claras, juntamente com as datas da sua vida, agora tão distantes. Diogo ficou ali, em silêncio, a olhar para a inscrição, sentindo o frio penetrar-lhe a roupa.

Ele nunca fora de exprimir emoções em voz alta. “Já cinco anos”, murmurou, sem esperar resposta. Era inútil, mas, ali, de pé, sempre lhe parecia que Leonor ainda podia ouvir os seus sussurros, como se o vento trouxesse o seu sopro das profundezas da terra.

Talvez por isso nunca tivesse conseguido deixá-la ir verdadeiramente. Fechando os olhos, Diogo respirou fundo, tentando proteger-se do vazio que o apertava no peito. De repente, os seus pensamentos foram interrompidos por um leve farfalhar.

Diogo franziu a testa e virou a cabeça. Foi então que o viu.
Sobre o túmulo de Leonor, enrolado num coberto velho e esfarrapado, estava um menino pequeno. Não teria mais de seis anos. O corpo frágil tremia de frio, e, nas mãos pequenas, segurava uma fotografia desbotada.

Diogo ficou paralisado, incapaz de acreditar no que via. A criança estava a dormir. A dormir em cima da lápide da sua mulher.
“Mas que raio…?”, murmurou, aproximando-se com cautela, as botas a ranger no cascalho gelado. Observou o menino: vestia um casaco fino, claramente inadequado para o inverno.

O cabelo estava despenteado pelo vento, a pele pálida devido ao frio. “Ei, miúdo!”, chamou Diogo, com voz firme mas suave. O menino não se mexeu.
“Acorda!” Tocou-lhe levemente no ombro. A criança estremeceu, ofegante, e abriu uns olhos grandes e escuros. Primeiro, piscou, assustada, depois fixou-os em Diogo.

Por um momento, ficaram apenas a olhar um para o outro. O menino apertou a fotografia com mais força e olhou rapidamente para a lápide sob ele. Os lábios tremeram, e sussurrou: “Mãe!”
Diogo sentiu um arrepio percorrer-lhe a espinha. “O que disseste?”, perguntou.

O menino engoliu em seco e baixou o olhar. Os ombros magros afundaram-se. “Desculpa, Mãe. Não queria adormecer aqui”, acrescentou, quase sem voz.
O coração de Diogo apertou-se. “Quem és tu?”, perguntou, mas o menino manteve-se em silêncio, apenas apertando a fotografia contra o peito, como se esta o pudesse proteger.

Diogo franziu a testa e tentou pegar na fotografia. O menino resistiu, mas não tinha força suficiente. Quando Diogo olhou para a imagem, o ar faltou-lhe. Era Leonor. Leonor a sorrir, com os braços em volta deste menino. “Onde arranjaste isto?”, a voz de Diogo tremia de incredulidade.

O menino encolheu-se. “Ela deu-ma”, sussurrou.
Diogo sentiu o coração a bater com força. “Isso é impossível”, escapou-se-lhe.

O menino ergueu a cabeça, e os seus olhos tristes encontraram os de Diogo. “É possível. A Mãe deu-ma antes de ir embora.”
Diogo sentiu o chão fugir-lhe debaixo dos pés. Leonor nunca lhe falara deste menino. Nunca.

Quem era ele? E porque estava a dormir no seu túmulo, como se ela fosse verdadeiramente a sua mãe? O silêncio entre eles tornou-se pesado, como um nevoeiro de inverno. Diogo apertou a fotografia de Leonor, mas a mente recusava-se a processar o que se passava. O menino olhava para ele com medo, como se esperasse ser afastado.

Diogo sentiu a irritação crescer no peito, misturada com um desconforto. Olhou novamente para o menino — Tiago, como viria a saber —, pequeno e indefeso, com aqueles olhos grandes que pareciam velhos demais para a sua idade. O menino tremia de frio, as faces vermelhas, os lábios gretados, como se não tivesse bebido algo quente há dias. Diogo franziu a testa.

“Há quanto tempo estás aqui?”, perguntou, mantendo a voz neutra.
“Não sei”, Tiago sussurrou, abraçando-se a si mesmo.

“Onde estão os teus pais?”, insistiu Diogo, mas o menino apenas baixou o olhar, em silêncio.
A paciência de Diogo esgotava-se, mas, em vez de pressionar, suspirou profundamente. Estar no meio de um cemitério a interrogar uma criança não fazia sentido. Tinha de agir.

“Vem comigo”, disse, sem rodeios.
Tiago arregalou os olhos. “Para onde?”

“Para um lugar quente”, respondeu Diogo, sem explicar.
O menino hesitou, os dedos a apertarem a fotografia. “Não ma vais tirar?”, perguntou baixinho, acenando para a imagem.

Diogo olhou para a fotografia de Leonor e devolveu-a a Tiago. O menino agarrou-a com ambas as mãos, como se fosse o seu último tesouro. Diogo inclinou-se e ergueu-o facilmente nos braços — era leve como uma pena, o que o preocupou ainda mais. Sem dizer uma palavra, dirigiu-se para a saída do cemitério.

Desta vez, ao deixar o túmulo de Leonor, Diogo sentiu algo novo. Não estava apenas a deixar a sua memória para trás, mas também a certeza de que não a conhecera por completo. E isso assustava-o mais do que estava disposto a admitir.

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