**Lisboa, 15 de Abril de 2023**
As luzes fluorescentes do Chiado tremeluziam sob o céu noturno, onde edifícios de vidro se erguiam como monumentos à ambição. Num desses prédios, sentava-se Eduardo Marques, um homem de quarenta e dois anos que tinha tudo—dinheiro, poder, influência. Mas, ao olhar pela janela para a cidade que nunca parecia adormecer, Eduardo percebeu que faltava algo: um herdeiro. Um legado de sangue e nome que nem os seus milhões podiam comprar.
Tentara o casamento—duas vezes. Ambos desmoronaram-se sob o peso das expectativas e traições. Eduardo concluiu que o amor não passava de uma ilusão frágil, um jogo que acabava em perda. Mas um filho—isso era diferente. Um filho era um investimento, continuidade. E ao contrário do amor, isso podia ser controlado, planeado, executado como qualquer outro negócio.
Na manhã seguinte, Eduardo deslizou para o seu carro desportivo, os bancos de couro rangendo sob o seu peso, e conduziu pelas ruas movimentadas de Lisboa. A sua mente não estava nas palmeiras que ladeavam as avenidas ou nos anúncios de marcas de luxo. Estava no problema de encontrar alguém disposto a ter um filho por ele. Alguém sem emaranhados emocionais, sem compromissos. Apenas um contrato.
Parado num semáforo perto do Rossio, algo chamou a sua atenção. Num canto do passeio, uma jovem mulher sentava-se no chão, desenhando num pedaço de papel rasgado. O cabelo castanho despenteado caía sobre o rosto, e os olhos azuis pareciam brilhar através da sujidade do cansaço. Parecia invisível para todos os que passavam, mas Eduardo notou. Contra os seus instintos, hesitou. *Quem raios desenha num passeio como se o resto do mundo não existisse?* pensou, amargo. Quando o sinal ficou verde, forçou-se a avançar, mas, alguns quarteirões depois, a imagem dela recostada sobre o desenho recusava-se a sair-lhe da mente. Com um resmungo frustrado, virou o volante e regressou.
Ela ainda lá estava, agora encostando o papel à parede. Eduardo parou junto ao passeio e baixou o vidro fumado. “Tu. Anda cá.”
A jovem ergueu a cabeça, a suspeita nublando-lhe o olhar enquanto estudava o homem de fato impecável ao volante. Hesitou.
“Não estou a pedir,” disse Eduardo, firme. “Não tenho o dia todo.”
Lentamente, com relutância, ela aproximou-se. De perto, a sua magreza era chocante, as roupas gastas, mas a postura mantinha uma dignidade silenciosa. “O que quer?” perguntou, a voz baixa mas firme.
“Entra. Vamos falar noutro lugar.”
Ela soltou uma risada seca. “Não sou uma dessas. Se é isso que está a pensar.”
O maxilar de Eduardo apertou-se. “Não sejas absurda. Não tenho tempo para isso. Quero apenas conversar. Agora entra, ou volta para o passeio.”
A hesitação permaneceu, mas a autoridade no seu tom deixou pouco espaço para recusa. Ela entrou no carro.
O silêncio no interior do veículo era pesado enquanto Eduardo conduzia até um café tranquilo, longe do barulho da cidade. Sentaram-se num canto, o murmúrio das conversas ao redor. Ele estudou o rosto dela à luz baixa.
“Como te chamas?” perguntou.
“Inês Ribeiro,” respondeu ela, seca. “Mas porque é que importa?”
“Porque preciso de saber com quem estou a lidar. Diz-me, Inês—porque é que te sentas nos passeios a desenhar como se nada mais existisse?”
Ela encolheu os ombros, evitando o seu olhar. “O que mais há para fazer? Não tenho para onde ir. Perdi tudo. Mas isso não é da sua conta.”
Eduardo inclinou-se para a frente. “Então vou direto ao assunto. Quero fazer-te uma proposta. Algo que pode mudar a tua vida.”
Os olhos dela estreitaram-se. “E o que seria?”
“Quero que tenhas um filho meu.”
Inês pestanejou, convencida de que ouvira mal. “Está a brincar, certo?”
“Estou falar sério. Vou cobrir todas as tuas despesas, dar-te apoio total durante a gravidez, e quando terminar, receberás dinheiro suficiente para nunca mais te preocupares em sobreviver na rua.”
Inês soltou uma gargalhada sem humor, cruzando os braços. “Está louco. Que tipo de homem faz uma proposta destas a uma estranha?”
“O tipo de homem que sabe exatamente o que quer. Não quero amor, Inês. Não quero drama. Apenas um filho. Simples assim.”
Ela fixou-o, as palavras dele ecoando na sua mente. A audácia da proposta deixou-a perturbada. Mas por trás do olhar gelado, havia uma determinação que não podia ignorar. Isto não era uma brincadeira.
“Isto é loucura,” sussurrou. “Nenhuma mulher em sã consciência aceitaria.”
Eduardo não pestanejou. “Nenhuma mulher na tua posição recusaria.”
As palavras atingiram-na como um murro. Por mais que quisesse desprezá-lo, a verdade arranhava-a. Ele estava a oferecer conforto, estabilidade, uma escapatória à fome e ao frio. Mas a que custo?
“E depois?” perguntou, finalmente. “O que acontece quando o bebé nascer?”
“Receberás uma quantia substancial. Suficiente para recomeçar. Sem compromissos. Serás livre.”
Ela riu-se, amarga. “E como sei que não vai mudar de ideias e arrastar-me para tribunal?”
“Sou um homem de negócios. Não faço acordos sem garantir que todas as partes beneficiam. Terás um contrato vinculativo. Nenhum de nós pode alterar os termos depois.”
O silêncio prolongou-se entre eles enquanto Inês absorvia as palavras dele. A voz da mãe ecoava-lhe na mente: *As oportunidades batem apenas uma vez*. Mas que tipo de oportunidade era esta?
Quando finalmente falou, a voz estava firme. “Preciso de tempo para pensar.”
Eduardo levantou-se, abotoando o casaco. “Tens vinte e quatro horas. Depois disso, a oferta desaparece.”
Ele saiu, deixando-a dividida entre a desesperança e a dignidade.
Naquela noite, enquanto o ar de Lisboa arrefecia, Inês enrolou-se num banco de jardim, a olhar para o céu encoberto. O amanhã traria a mesma fome, a mesma invisibilidade, a menos que aceitasse. Mesmo assim, dentro dela, a ideia de entregar uma criança—*a sua* criança—consumia-lhe a alma.
Entretanto, Eduardo sentava-se no seu escritório na cobertura, com vista para a cidade. O contrato estava à sua frente, redigido pelos seus advogados com precisão. Odiava esperar, mas estava certo. Se Inês recusasse, outra aceitaria. Mas algo nela—a artista com fogo nos olhos—ficara-lhe cravado na mente.
Na noite seguinte, o intercomunicador tocou. “Sr. Marques, Inês Ribeiro está aqui.”
O coração de Eduardo acelerou mais do que esperava. “Manda-a subir.”
Minutos depois, ela estava à sua porta. Os olhos estavam cansados, mas a voz era firme.
“Aceito.”
Eduardo estudou-a, procurando hesitação, mas não havia nenhuma. Apontou para a mesa. “Então vamos torná-lo oficial.”
O contrato era claro. Eduardo forneceria casa, comida, cuidados médicos e compensação. Em troca, ela renunciaria a todos os direitos sobre a criança. Inês assinou o nome com um traço rápido, selando um pacto que mudaria as suas vidas para sempre.
E assim começE no final, entre os risos dos gémeos e o sol a pôr-se sobre o Tejo, Eduardo e Inês descobriram que o contrato que os havia unido era apenas o primeiro capítulo de uma história escrita pelo destino, que sempre soube que o amor, quando verdadeiro, não se negoceia, mas constrói-se dia após dia, como os alicerces de uma casa feita para durar.





