A sala do paciente no 7º andar de um hospital privado estava estranhamente silenciosa. O monitor cardíaco pulsava em ritmo constante, e a luz branca iluminava o rosto pálido de Leonor—uma mulher a recuperar-se de uma cirurgia à tiroide.
Ainda meio adormecida pela anestesia, Leonor pestanejou e viu o marido, Álvaro, junto à cama, com uma pilha de papéis nas mãos.
— Acordaste? Ótimo. Assina isto.
A voz dele soou distante, sem qualquer traço de afeto.
Leonor franziu a testa, confusa:
— O que é isso… que tipo de documentos?
Álvaro deslizou os papéis na sua direção, respondendo secamente:
— Os papéis do divórcio. Já preenchi tudo. Só tens de assinar.
Leonor gelou. Os lábios abriram-se, mas a garganta ainda doía da cirurgia. As palavras não saíram. Os olhos encheram-se de descrença e dor.
— Isto… é alguma piada de mau gosto?
— Falo a sério. Já te disse—não posso continuar com alguém frágil e sempre doente. Estou cansado de ser o único a tentar. Mereço seguir o que sinto.
A voz de Álvaro era estranhamente calma, como se estivesse a falar de mudar de seguro, e não de acabar com um casamento de dez anos.
Um sorriso leve surgiu nos lábios de Leonor, lágrimas escorrendo em silêncio.
— Então… esperaste até eu não conseguir mexer-me nem falar… para me fazeres assinar isto?
Álvaro hesitou um instante, depois anuiu:
— Não me culpem. Isto já estava decidido. Conheci alguém. Ela já não quer viver escondida.
Leonor mordeu o lábio suavemente. A garganta ardia, mas a verdadeira dor estava no peito. Mesmo assim, não gritou nem chorou.
Apenas perguntou, baixinho:
— Onde está a caneta?
Álvaro ficou surpreso. — Tu… vais mesmo assinar?
— Disseste-o tu. Era só uma questão de tempo.
Ele entregou-lhe a caneta. Leonor segurou-a com dedos trémulos e escreveu o nome devagar.
— Está feito. Desejo-te paz.
— Obrigada. Vou devolver o que combinámos. Adeus.
Álvaro virou-se e saiu. A porta fechou-se—suavemente demais. Mas três minutos depois, abriu-se outra vez.
Entrou o Dr. Guilherme, velho amigo de faculdade e cirurgião que a operara. Trazia a ficha médica e um ramo de cravos brancos.
— A enfermeira disse que o Álvaro esteve aqui?
Leonor acenou levemente, sorrindo:
— Sim, veio para o divórcio.
— Estás bem?
— Melhor que bem.
Guilherme sentou-se ao lado dela, pousou as flores e tirou um envelope.
— São os papéis do divórcio que a tua advogada pediu para eu guardar. Disseste-me: se o Álvaro os trouxesse primeiro, assinavas estes e mandavas de volta.
Sem hesitar, Leonor abriu o envelope e assinou. Depois, virou-se para Guilherme, o olhar brilhando com uma força serena:
— A partir de agora, vivo por mim. Não vou dobrar-me para ser a “esposa perfeita”. Não vou fingir força quando estou esgotada.
— Eu estou aqui. Não para substituir ninguém, mas para te apoiar, se deixares.
Leonor acenou. Uma única lágrima escorreu—não de sofrimento, mas de paz.
Uma semana depois, Álvaro recebeu uma carta registada. Dentro, estava a sentença de divórcio. Junto, uma nota escrita à mão:
*”Obrigada por ires embora, para eu parar de me agarrar a quem já me largou.*
*A pessoa que ficou para trás não sou eu.*
*És tu—para sempre sem a mulher que um dia te deu todo o seu amor.”*
Naquele momento, Álvaro percebeu: quem pensou estar a acabar com tudo foi o verdadeiro abandonado.