Marido mandou a sogra viajar, mas não esperava que eu também fosse embora — para sempre

**O Mar e a Escolha**

*Diário de uma despedida*

— Joana, as tuas férias estão canceladas — anunciou o Vítor durante o jantar, com um sorriso presunçoso que me irritou profundamente. Ele sabia bem o que estava a fazer. — Comprei uma viagem para a minha mãe. Ela sempre sonhou em ver o Algarve, percebes? Merece finalmente descansar. Em vez de ires tu, vai ela.

Olhei para o prato, depois para ele, calma. Estudei cada traço do seu rosto, como se fosse a primeira vez. Sorri, sem rancor, sem ironia. Apenas aceitei.

— Claro que não me importo, querido — respondi, cortando um pedaço de bacalhau. — Se a tua mãe sonhava com o mar, quem sou eu para negar-lhe isso?

Foi aí que o vi hesitar. Esperava gritos, pratos a voar, drama. Mas encontrou apenas silêncio. Um silêncio que o perturbou.

— Então… não tens problema com isto? — perguntou, já menos seguro.

— Nenhum, Vítor. A felicidade dela é a nossa também, não é?

Três dias depois, a Dona Margarida partiu: mala cheia, chapéu de sol novo e um sorriso que me cortou a alma.

— Olha, Joana, trouxe estas sandálias da vizinha Celeste! Nem vou devolver, que ela tem inveja de mim às palas! Oh, Vítor, meu menino, obrigada! Um verdadeiro cavalheiro! — Apertei-lhe a mão, suportei o abraço sufocante.

Naquela noite, Vítor abriu uma cerveja e afundou-se no sofá, satisfeito. Nem suspeitava.

No dia seguinte, não voltei para casa. O telemóvel ficou mudo. Quando se deu conta do meu desvanecimento, foi tarde: o meu champô sumira da casa de banho, o meu vestido favorito desaparecera do guarda-roupa, até o meu novo biquíni—aquele que ele nem chegou a ver—só deixara um vazio no cesto.

Um dia depois, chegou a mensagem: *”Adeus, Vítor. Se não podes dar-me o mar, eu própria o encontro. Não bebas muito—até sóbrio já foste difícil de aturar. Beijos, Joana.”*

Anexo? Uma foto. Eu na Praia da Rocha, vestido leve, chapéu de palha, um mojito na mão. E ao meu lado, o Rui: alto, barba bem feita, sorriso descontraído. Ambos felizes.

Ele ficou parado, o écran a queimar-lhe os olhos. *Como?* Passou três dias a beber Sagres, depois aguardente, até desabar num sono pesado. O único som era o miar irritado do gato, abandonado à sua fome.

No sétimo dia, a Dona Margarida regressou—bronzeada, energética, com um íman de um galo de Barcelos na mala.

— Filho, estou em casa! O Algarve é maravilhoso! O mar, a comida… Ah, só comi demasiados pastéis de nata e passei um dia na cama, mas valeu a pena! — Olhou em redor. — Onde está a Joana?

Vítor, despenteado, mal cheiroso, fitou-a com olhos inchados.

— Foi-se. No segundo dia depois da tua partida. Mandou mensagem, uma foto… Está com um tal Rui. — A voz dele rachou. — Disse que se eu não lhe dava o mar, ela arranjava sozinha.

A Dona Margarida empalideceu, como se lhe tivessem batido com uma colher de pau.

— *Meu Deus…* Eu só queria que fosses feliz… — murmurou, desabando numa cadeira.

Mês e meio depois, receberam os papéis do divórcio. Ele assinou sem ler.

E eu? Viajei. Publiquei fotos: Lisboa, Porto, até Paris. Vestido cor de vinho do Porto junto à Torre Eiffel, Rui ao meu lado. Na legenda, escrevi: *”Quando uma mulher deixa de esperar, encontra.”*

Um dia, bati à porta do apartamento. Ele abriu, perplexo.

— Olá, Vítor. Vim buscar o resto das minhas coisas.

Ele engoliu em seco.

— Estás feliz com o Rui?

— Muito. Mas o mais importante é que ele me respeita—algo que nunca fizeste.

— Foi por causa da viagem da minha mãe?

Abanei a cabeça.

— Foi porque sempre a escolheste em vez de mim. Nos jantares, nas férias, até quando só te pedia uma noite a sós.

Ele não respondeu. Sabia que era verdade.

— Sabe porque não fiz escândalo naquela noite? — sorri, leve. — Porque percebi: se não sabias escolher, eu escolhia por ti.

Peguei no álbum de fotografias, dei-lhe um último olhar.

— Adeus.

Saí.

Na cozinha, ouvi a Dona Margarida chorar.

*Seis meses depois*

O Vítor parou de beber. A mãe envelheceu dez anos. Eu, entretanto, aprendi a dançar fado, provei francesinhas no Porto, planeio adotar um cão.

— Não te arrependes? — perguntou-me o Rui, numa tarde à beira-mar.

Abanei a cabeça.

— Finalmente sei o que é ser amada, não apenas tolerada.

O mar beijava a areia. O vento trazia o cheiro do sal.

Sorri.

Afinal, bastou uma viagem maldita para eu encontrar a minha própria costa.

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