Netinho Abandona o Vovô nas Férias, Mas Um Dos Meninos o Aquece o Coração

As portas deslizaram abertas.
Meus sapatos bateram no azulejo.

O ar cheirava a protetor solar e flores de lobby.
Atrás do balcão, vi ele—meu avô.

Estava parado, ombros caídos, segurando um pedaço grosso de papel com as duas mãos.
Tremia levemente.

“Disseram que era por conta deles,” murmurou.
“Não quis causar confusão.”

Acharam que ele não diria nada.
Não contavam com a minha chegada.

Dois meses antes, o Avô tinha-se reformado.
Tinha 74 anos.

Trabalhara 52 anos como torneiro mecânico.
Nunca faltou um dia, a não ser por doença, e mesmo assim ligava para saber como estavam as coisas.

Era um homem quieto.
Da velha guarda.

Do tipo que consertava tua estante quebrada sem ser pedido e deixava 20 euros na mesa “para o almoço.”
Todo aniversário, aparecia com um cartão e dinheiro dentro.

Nunca se esquecia de ninguém.
Sempre dava.
Nunca pedia nada.

Minha tia—filha dele—disse que precisávamos fazer algo especial pelo seu aniversário.
Minha prima Leonor ficou entusiasmada.

“Vamos levar o Avô a um lugar bom,” disse.
“Um resort na praia.

Algo luxuoso.”
Todos aderiram.

Foi marcada uma semana tudo incluído no Algarve.
A Leonor tratou de tudo.

Reservou cinco quartos.
Escolheu uma suíte com varanda privada só para o Avô.

“Ele merece,” disse.
“Fez tudo por esta família.

É a vez dele descansar.”
Disseram-lhe para não se preocupar com dinheiro.

“É por nossa conta, Avô,” a Leonor disse, sorridente.
Ele hesitou.

“Têm certeza?
Não quero ser um peso.”

“Que disparate,” respondeu.
“É por sua causa que estamos aqui.”

Então fez a mala—uma só—levou o chapéu de pesca, calçou sandálias pela primeira vez em dez anos.
E partiram.

As fotos começaram no primeiro dia.
Selfies à beira da piscina.

Bebidas chiques.
Serviço de quarto.

Hashtags como #FamíliaEmPrimeiro e #HomenagemAoRei.
Eu só pude ir no último dia.

O trabalho manteve-me na cidade, mas comprei um voo só de ida.
Iria levar o Avô a casa em segurança.

Ele não gostava de aeroportos.
Dizia que o deixavam perdido.

Quando cheguei, o sol brilhava.
Palmeiras balançavam ao vento.

Entrei no hotel com um sorriso.
Esse sorriso desapareceu em segundos.

O Avô, sozinho.
Conta na mão.

Mala pronta.
Todos os outros, idos.

“Disseram que estava tudo pago,” falei, a voz a tremer.
Ele anuiu devagar.

“Foi o que pensei também.
Mas hoje de manhã, prepararam-se para sair.

Disseram que o check-out era ao meio-dia.
Que iam para o aeroporto.”

Fez uma pausa.
“A Leonor disse que eu precisava ir ao balcão assinar algo.”

A fatura estava detalhada.
Cobranças dos quartos.

Sessões de spa.
Coquetéis.

Aluguer de barcos.
Champanhe.

Tudo cobrado à suíte.
A dele.

“Por que não me ligaste?” perguntei.
Ele encolheu os ombros.

“Não quis incomodar.
Pensei… talvez tivesse poupanças suficientes.”

Os olhos dele baixaram.

“Não quis armar barulho,” disse.
“O importante é… eles divertiram-se.”

Olhei para ele.
Depois para aquela fatura.

Fechei as mãos.
“Já volto,” disse.

Saí e peguei no telemóvel.
Liguei para a Leonor.

Atendeu ao segundo toque.
“Olá, primo!” disse, alegre como sempre.

Minha voz estava seca.
“Por que deixaste o Avô com uma conta de 10.000 euros?”

Silêncio.
Depois, uma risada.

“Estás a falar a sério?” perguntei, sabendo que não iria gostar da resposta.
“Ah, vá lá,” disse ela.

“Ele está reformado.
Tem poupanças.

Não é que esteja a passar necessidades.”
Não respondi.

Ela continuou.
“Achámos que ele podia oferecer-nos isto.

Já não sustenta a família.
Esta viagem era tipo… um agradecimento.

Dele para nós.”
“Achaste?” minha voz apertou.

“Achaste correto largar uma conta de dez mil euros nas costas de um homem de setenta e quatro anos, sem perguntar?”
“Não exageres,” retorquiu.

“Conheces o Avô.
Fica feliz só de nos ver juntos.”

Observei a estrada em frente ao hotel.
Apertei o telemóvel.

Um arrumador passou com malas alheias.
Risadas vinham da piscina.

“Deixa-me esclarecer uma coisa,” disse.
“O tolo aqui não é ele.

És tu.”
Ela bufou.

“Relaxa.
Se é assim tão grave, falamos disso no Natal.”
Desligou.

Fiquei parado, respirando fundo.
Ouvi o Avô atrás de mim, ainda a tentar explicar-se no balcão, ainda a pedir desculpas—pela desordem deles.

Virei-me e entrei.
“Não te preocupes,” disse ao Avô, alto para a receção ouvir.

“Eu trato disto.”
Ele parecia nervoso.

“É muito dinheiro.
Não quero que—”

Levantei a mão.
“Está resolvido.”

Paguei a conta com o meu cartão.
Tudo.

A gerente imprimiu uma cópia.
Ao entregá-la, pedi: “Quero as cobranças discriminadas também. Por quarto.”

Ela concordou.
“Claro.”

“E quero nomes, horários de check-in e check-out, cópias das assinaturas.”
Ela não perguntou porquê.

Apenas disse: “Envio tudo por e-mail dentro de uma hora.”
Voltei-me para o Avô.

Segurava a mala, ainda hesitante.
Os ombros rígidos, como à espera de uma repreensão.

“Vou levar-te para casa,” disse.
“Mas primeiro, vamos tomar um batido.”

O sorriso dele foi lento.
“Sempre gostaste dos de chocolate.”

Naquela noite, liguei ao meu advogado, um amigo da faculdade.
Era arguto.

Não perdia um detalhe.
Expliquei tudo.

O hotel.
A fatura.

O abandono.
“Manda-me o que tens,” pediu.
“Vamos documentar tudo.”

De manhã, tinha:
A conta completa, com cada nome dos primos associado ao seu quarto.

Filmagens da segurança a mostrá-los a sair, malas nas mãos, sem olhar para trás.
Declarações dos funcionários confirmando que o Avô fora deixado para trás e informado de que pagaria.

Redigimos cartas.
Formais, educadas, mas firmes.

“És responsável pelos valores abaixo.
Pagamento esperado em 14 dias.

Caso contrário, avançarei para pequenas causas por fraude, abuso financeiro de idoso e abandono.”
Cada carta incluía a fatura, com os seus gastos assinalados a amarelo.

A da Leonor foi a mais longa.
Upgrades de champanhe.

Massagem a dois.
Passeio de barco ao pôr do sol.

Depois, enviei pedidos no MB Way.
Nada agressivoE, no final, enquanto o Avô regava as suas rosas no quintal, percebi que o verdadeiro luxo nunca esteve no Algarve, mas sim na honra de cuidar daqueles que sempre cuidaram de nós.

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