O Segredo da Minha Filha: Por Que Ela Roubava as Galinhas do Vizinho

No começo, eu pensei que fosse uma fase.
De vez em quando, encontrava a Galinha Chica—a galinha gorda e mandona da vizinha—no nosso quintal, mesmo sem termos nenhuma galinha. A minha filha Beatriz estava sempre por perto, abraçando-a como se fosse um boneco de pelúcia, sussurrando segredos nas suas penas.

Eu levava a Chica de volta para a casa da Dona Teresa, a vizinha, e pedia desculpa toda a vez. Ela só ria e dizia: “Essa tua menina ama com o coração grande. Não há mal nisso.”

Mas então, uma tarde, apanhei a Beatriz a levar a Chica outra vez. Desta vez, tinha um cobertor e um pacote de sumo numa carrocinha, como se estivesse a preparar uma viagem.
Agachei-me e perguntei: “Meu amor, por que é que tu continuas a trazer a Chica para cá?”

Ela olhou para mim, com os olhos cheios de lágrimas, e sussurrou: “Porque a Dona Teresa disse que vai pô-la a dormir. Como fizemos com o Avô. E a Chica nem fez nada de mal.”
O meu coração apertou.

Não soube o que dizer, então levei-a de volta. A Dona Teresa estava a podar umas plantas perto da cerca quando nos viu. Antes que eu pudesse explicar, a Beatriz exclamou: “Não pode levá-la embora! Eu prometi que ela estava segura!”

Dona Teresa suspirou. Longo e cansado.
Depois, disse algo que me fez olhar para ela e para a galinha com outros olhos:

“A Chica não é uma galinha qualquer. Era do meu marido, o Joaquim. Ele trouxe-a no ano antes de partir.”

Olhei para o rosto dela. A sério. As rugas à volta da boca não eram só de idade—guardavam dor. Dor que fica connosco à noite, quando todos já dormem.

“Ela é a última coisa que me resta dele,” disse, quase num sussurro. “Mas já está velha. Não põe ovos. Come muito. O veterinário disse que tem um tumor. Não tenho dinheiro para outra operação.”

Fiquei sem palavras. A ideia de sacrificar um bicho por falta de dinheiro pesou-me no peito. Olhei para a Beatriz, que agora acariciava a Chica como se quisesse confortar a galinha e a si mesma.

“A Beatriz acha que pode salvá-la,” eu disse, suavemente.

Dona Teresa sorriu, triste. “Essa menina tem um coração de heroína. Mas o coração não paga contas de veterinário.”

Naquela noite, deitei a Beatriz. Ela perguntou: “Mãe, não podemos ajudar a Chica?”

Disse-lhe a verdade—que nem tudo é simples, que às vezes temos de fazer escolhas difíceis. Mas ela não chorou. Assentiu e disse: “Então eu vou simplificar.”
Não percebi o que ela queria dizer até uns dias depois.

A Beatriz montou uma banca de limonada.
Isso não era raro—as crianças fazem-no muitas vezes. Mas ela não estava a vender a 50 cêntimos o copo. Pedia doações “para salvar a Chica”. Até fez um cartaz com um desenho da galinha e um coração à volta.

E as pessoas vieram.
Primeiro os vizinhos. Depois, alguém partilhou uma foto na internet. De repente, havia carros de outras terras a parar para comprar limonada à minha filha, de olhos grandes e coração maior.

Em uma semana, ela juntou mais de 300 euros.

Nem eu nem a Dona Teresa acreditámos.

Quando lhe entreguei o envelope, ela ficou a olhar para ele. “O que é isto?”, perguntou, embora soubesse.

“É para a Chica,” eu respondi. “A Beatriz quis ajudar com os tratamentos.”

Dona Teresa sentou-se nos degraus da varanda. As lágrimas escorriam-lhe pelo rosto, e ela não as enxugou. Sussurrou: “O Joaquim teria adorado essa menina.”

A Chica foi operada na terça-feira seguinte.
O tumor era benigno.

O veterinário disse que ela podia ser velha e rabugenta, mas ainda tinha uns bons anos pela frente. A Beatriz ficou radiante. Fez uma medalha de papel e colocou-a na porta do galinheiro: “Galinha Mais Corajosa do Mundo”.

Mas então as coisas mudaram.

Dois meses depois, a Dona Teresa caiu e partiu o quadril.

Foi de manhã cedo, e ninguém saberia se a Beatriz não tivesse ido lá dar comida à Chica antes da escola. Encontrou-a no jardim, semiconsciente e gelada.

A ambulância chegou a tempo.
Os médicos disseram que, se demorasse mais uma hora, poderia ter sido pior. Ela ficou no hospital, depois num centro de reabilitação. A Beatriz visitava-a duas vezes por semana, levando desenhos, notícias da Chica e até vídeos.

Um dia, a Dona Teresa perguntou-me: “Importas-te de ficar com a Chica para sempre? Não vou voltar para aquela casa tão cedo.”

Hesitei. Não porque não quisesse, mas porque percebi o que aquilo significava—era a sua forma de deixar ir.

Levámos o galinheiro da Chica para o nosso quintal, à sombra. A Beatriz enfeitou-o com fitas e chamou-lhe “Castelo da Chica”.

Naquele verão, aconteceu uma coisa incrível.

Um dos ovos velhos da Chica, esquecido num canto do galinheiro, sobreviveu. Eclodiu. Saiu de lá um pintainho desengonçado, que encontrei quando estava a ajudar a sobrinha da Dona Teresa a arrumar as coisas.

Chamámos-lhe Trevo.
A Beatriz disse que era um milagre. E eu acho que ela tinha razão.

A Chica cuidou dele como se tivesse nascido para ser mãe. E, ao ver a Beatriz com as duas—a ensinar, a alimentar, a sussurrar segredos—percebi que isto nunca foi só sobre uma galinha.

Foi sobre cuidar quando outros não cuidam.
Sobre escolher bondade em vez de conveniência.
Sobre uma menina que não via uma galinha velha, mas uma amiga que ainda tinha vida para viver.

A Dona Teresa nunca mais voltou para a casa dela. A sobrinha vendeu-a na primavera seguinte, mas não sem antes mandar construir uma rampa e levantar os canteiros, caso ela quisesse visitar.

Ela voltou uma vez, no outono, de bengala e com um sorriso trémulo.

Sentou-se junto ao Castelo da Chica e viu a Beatriz a brincar com o Trevo na relva.

“Ela também me salvou, sabes,” sussurrou. “A tua menina. Lembrou-me como é o amor.”

Assenti. Não havia mais nada a dizer.

Agora, quando vejo a Chica a andar pelo quintal ou ouço a risada da Beatriz a entrar pela porta, lembro-me de como tudo começou—com uma menina que não aceitava um não como resposta.

E eu agradeço por isso.

Porque, às vezes, o coração de uma criança vê o que os adultos esquecem—que toda a vida, seja pequena, emplumada ou enrugada, merece uma chance.

Então, o que achas? Já subestimaste o poder do amor de uma criança?
Se esta história te tocou, mesmo que seja um pouco, partilha-a com alguém que precise de lembrar que a bondade pode, sim, mudar o mundo.

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